13 abril 2009

A donzela que era mais sábia que o Czar

Era uma vez um homem pobre que tinha uma única filha.
Essa jovem era surpreendentemente sábia; parecia possuir uma compreensão muito acima do que seria de se esperar na sua idade e freqüentemente dizia coisas que espantavam a seu próprio pai.
Um dia, quando estava sem um centavo, esse homem foi visitar o czar, para pedir ajuda.
O czar ficou atônito ao ver a forma refinada com que o homem falava, e perguntou-lhe onde havia aprendido aquelas frases.
- Com minha filha – respondeu o homem.
- Sim, mas onde a sua filha aprendeu? – perguntou o czar.
- Deus e nossa pobreza a tornaram sábia – foi a resposta.
- Aqui está algum dinheiro para as suas necessidades imediatas – disse o czar, - e trinta ovos, para que você peça à sua filha, em meu nome, para que os ponha a chocar para mim. Se ela o fizer com êxito darei a vocês ricos presentes. Caso ela não o consiga, você será torturado.
O homem voltou para casa e deu os ovos para sua filha, que os examinou, pesando um ou dois em suas mãos, e assim ela se deu conta de que eram ovos cozidos. Disse ao pai:
- Pai, espere até amanhã. Talvez eu descubra o que se pode fazer.
No dia seguinte ela acordou bem cedo e, tendo pensado uma solução, ferveu algumas sementes. Colocou-as dentro de uma pequena bolsa e deu-a a seu pai, dizendo:
- Vá com o arado e os bois, pai, e comece a arar ao lado do caminho por onde o czar passa quando está indo à igreja.
No momento que o czar puser sua cabeça para fora da janela da carruagem você deve gritar: ‘Vamos, bravos bois, arem a terra para que estas sementes cozidas cresçam bastante’!
O pai fez o que sua filha havia dito, e, conforme a previsão dela, o czar olhou o homem trabalhando pela janela da carruagem. Quando escutou o que ele gritava, disse:
- Homem estúpido, como você pode esperar que sementes cozidas produzam algo?
O homem, prevenido pela sua filha, gritou:
- Da mesma forma como ovos cozidos produzem pintos!
O czar então seguiu o seu caminho, sabendo que a jovem havia sido mais esperta do que ele.
Porém as coisas não terminariam assim...
No dia seguinte o czar enviou fio de linho enrolado e embaraçado à casa do homem. O mensageiro disse:
- Este linho deve ser usado para fazer velas para o barco do meu senhor, e isto deve ser feito até amanhã. Caso contrário você será executado.
Chorando o homem entrou em casa, mas sua filha lhe disse:
- Não tenha medo pai, pensarei em uma solução.
Na manhã seguinte ela se dirigiu a seu pai e entregou-lhe um pedaço de madeira, dizendo:
- Diga ao czar que se ele puder fazer todos os instrumentos necessários para fiar e tecer deste pedaço de madeira, eu farei o tecido para as velas com este linho.
O homem fez conforme a sua filha havia indicado, e o czar ficou ainda mais impressionado com a resposta da jovem. No entanto ele pôs uma pequena taça na mão do homem e disse:
- Vá, leve esta taça para sua filha e peça-lhe para esvaziar o mar com ela, porque assim poderei aumentar meus domínios com novas pastagens.
- O homem voltou para casa e deu a taça à filha, dizendo-lhe que o governante havia pedido novamente algo impossível de ser feito.
- Vá se deitar – disse ela. – Pensarei em algo, concentrando minha mente nisto toda a noite.
Ao amanhecer chamou o pai e disse:
- Diga ao czar que se ele puder represar todos os rios do mundo com este pedaço de estopa, então esvaziarei o mar par ele.
O pai voltou ao palácio e contou a czar o que a sua filha dissera.o czar reconhecendo que ela era mais sábia do que ele, pediu que ela fosse enviada à corte imediatamente. Quando ela se apresentou, ele lhe perguntou:
- O que é que pode ser ouvido a uma grande distância?
Sem vacilar, ela respondeu imediatamente:
- Somente o trovão e a mentira podem ser ouvidos desde os pontos mais distantes, ó czar.
Antonio, o czar segurou sua própria barba, e virando-se para os cortesãos lhe perguntou:
- Quanto acham que vale a minha barba?
Todos começaram a calcular o que pensavam que a barba valia, dando-lhe preços cada vez mais altos para adular Sua Majestade. Então o czar perguntou à donzela:
- E você, minha criança, quanto você acha que vale a minha barba?
Os cortesãos aguardavam atentos a resposta:
- A barba de Vossa Majestade vale três chuvas de verão.
O czar muito surpreendido, disse:
- Você respondeu corretamente. Eu me casarei com você e farei de você minha esposa hoje mesmo.
E assim a jovem se tornou a czarina. Mas assim que as bodas terminaram ela disse ao czar:
- tenho um pedido para fazer. Conceda-me a graça, escrita com letra de sua própria mão, de que se você ou qualquer um da sua corte desgostar-se comigo, e eu tiver que partir, me será permitido levar comigo aquilo de que eu mais gostar.
Enquanto com a bela donzela, o czar pediu uma pena e um pergaminho e imediatamente escreveu, selando o documento com seu anel de rubi, tal como ela havia solicitado.
Os anos se passaram com muita felicidade para ambos. Um dia porém o czar teve uma acalorada discussão com a czarina e, irritado, ordenou:
- Vá embora! Desejo que deixe este palácio para nunca mais voltar.
- Então irei embora amanhã – disse a jovem czarina, obedientemente. – Permita-me somente passar a noite aqui para preparar meu regresso a casa.
O czar concordou e, antes de deitar-se, tornou a bebida de ervas que ela sempre preparava para ele. Assim que bebeu o czar caiu adormecido. A czarina levou-o para à carruagem real, e partiram para a cabana de seu pai.
Quando amanheceu o czar, que havia dormido tranqüilamente a noite inteira, despertou, olhando desconcertado ao seu redor.
- Traição! – gritou. – Onde estou e de quem sou prisioneiro?
- Meu, Vossa Majestade – respondeu a czarina docemente. – O documento escrito por sua própria mão está aqui.
Lhe mostrou o pergaminho onde ele havia escrito que se ela tivesse que sair do palácio poderia levar aquilo de que mais gostasse.
Quando o leu, o czar riu de coração, e declarou que seu afeto por ela ainda era o mesmo.
Ao que ela respondeu:
- Meu grande amor por você, ó czar, me fez assim tão audaciosa. Mas, se arrisquei minha vida, isso demonstra o quanto amo você.
E foi assim como eles se uniram novamente e viveram felizes para o resto de suas vidas.

Extraído do livro: Histórias da Tradição Sufi.

A Água do paraíso

Harith, o Beduíno, e sua esposa, Nafisa, indo de um lugar para outro, erguiam sua tenda esfarrapada onde quer que encontrassem tamareiras, ervas para alimentar seu camelo ou um poço se água salobra. Esta vinha sendo sua forma de vida por muitos anos, e Harith raramente variava sua rotina diária: caçando ratos para aproveitar-lhes a pele, traçando cordas de fibras de palma, que vendia aos caravaneiros que por ali passavam.
Um dia contudo surgiu um novo manancial no areal, e Harith levou um pouco daquela água aos lábios. Teve a impressão de estar provando a verdadeira água do paraíso, pois era muito menos suja do que aquela que estava acostumado a beber. A outra teria parecido desagradavelmente salgada.
- Devo levar isto à alguém que irá apreciá-lo – disse Harith.
E foi assim que partiu rumo a Bagdá, em busca do palácio de Harun el-Raschid, viajando sem deter-se a não ser para mastigar algumas tâmaras. Harith levou consigo dois odres de couro cheios daquela água: um para ele e outro para o califa.
Dias depois chegou a Bagdá, e se dirigiu logo ao palácio.
Ali os guardas ouviram sua história e, somente por ser esta a norma usual, deixaram-no participar da audiência publica de Harun el-Raschid.
- Comendador dos Crentes – disse então Harith, - eu sou um pobre beduíno e conheço todas as águas do deserto, embora sabia pouco acerca de outras coisas. Acabo de descobrir esta água do paraíso e, julgando-a uma oferenda digna de vós, vim logo oferecê-la.
Harun, o Íntegro, provou da água, e, como compreendia seu povo, ordenou aos guardas palacianos que levassem Harith e o mantivessem detido por algum tempo, até tornar conhecida sua decisão sobre aquele caso. Depois chamou o capitão da guarda e lhe disse:
- O que para nós não é nada, para ele é tudo. Portanto devem levá-lo desse palácio durante a noite. Não deixem que veja o poderoso rio Tigre. Escoltem-no até a sua tenda no deserto, sem permitir que prove água doce. Então dêem mil moedas de ouro a ele, juntamente com os meus agradecimentos por seu serviço. Digam-lhe que é o guardião da água do paraíso e que a distribua gratuitamente, em meu nome, a todos os viajantes.


Extraido do livro: Histórias da Tradição Sufi

05 abril 2009

A Mulher e o Ser Espiritual

Vejamos o velho conto da mulher e o ser espiritual.

Era uma vez uma pobre mulher que ajudou a um ser espiritual disfarçado, dando-lhe hospitalidade quando outras pessoas o haviam
botado para fora.

Quando se retirou da casa da mulher ele falou:

- Amanhã, procure realizar tua primeira tarefa durante o dia todo.

Ela pensou que era uma estranha forma de mostrar agradecimento, mas, em seguida esqueceu o assunto.

No dia seguinte um mercador trouxe para a mulher um pequeno carretel de fibra de ouro e pediu para que ela lhe bordasse uma capa, pois bordar era seu trabalho, quando conseguia ter algum.

Então ela desenrolou o fio de ouro e bordou a roupa.

Quando terminou, viu que tinha ainda mais fio de ouro no chão do que quando havia começado seu trabalho.

Quanto mais enrolava o fio de ouro numa bola, mais fio aparecia. Enrolou o dia inteiro e a noite tinha uma grande quantidade de ouro. Por tradição, o fio restante pertencia a bordadeira.

Vendeu este fio de ouro, e com o dinheiro pode reconstruir sua casa e mobiliá-la, assim como estabelecer-se com um bom negócio.

Como é natural, os vizinhos sentiram curiosidade, e ela lhes contou como havia mudado a sua sorte e como tudo tinha acontecido.

Algum tempo mais tarde, um mercador da mesma cidade viu e reconheceu o forasteiro com poderes mágicos do qual a mulher lhe falara e o convidou a sua loja e a sua casa. Mostrou para com o ser
espiritual uma grande hospitalidade, imitando a forma de agir das pessoas generosas, extremando inclusive suas atenções.


Pensava: “Espero que agora me toque algo a mim... E, por suposto, a todos os deste povo”. Agregou a segunda frase a seu pensamento porque, apesar de ser cobiçoso, imaginou que lembrando-se dos outros obteria algo para si, mas não obstante, estava imitando a caridade, porque não pensava que o bem dos outros equivalia a seu próprio bem, salvo com idéia posterior; mas para ele as coisas resultaram diferentes de como foram para a mulher caridosa.

Quando o forasteiro estava a ponto de partir o mercador lhe falou:

- Concede-me uma graça.

- Eu não faço tal coisa - disse o forasteiro - mas eu desejo que tua primeira preocupação de hoje dure para você toda uma semana.

O ser espiritual continuou seu caminho e o mercador se dirigiu à sua loja, aonde se propunha contar dinheiro e multiplicá-lo toda uma semana.

Ao atravessar seu próprio pátio, o mercador se deteve para beber água do poço. Tão pronto como subiu o primeiro balde cheio, se sentiu obrigado a extrair outro e mais outro e assim continuou durante toda uma semana.

A água inundou sua casa, depois a de seus vizinhos e finalmente todo o povoado, provocando quase sua ruína...

A Parábola dos Filhos Cobiçosos

Havia uma vez um lavrador generoso e muito trabalhador que tinha vários filhos, todos preguiçosos e cheios de cobiça. Em seu leito de morte, o velho lavrador lhes disse que encontrariam seu tesouro se viessem a cavar num lugar determinado. Assim que o lavrador morreu, seus filhos correram para o campo, que escavaram de ponta a ponta, com ânsia e desespero crescentes ao não encontrar o ouro no trecho indicado.

Não encontraram o que buscavam. Imaginando então que por ser muito generoso, o pai distribuíra seu ouro em vida, desistiram da busca. Por fim, pensaram que, já que a terra fora revolvida, poderiam plantar ali algum cereal. Assim plantaram trigo, que cresceu e deu abundante safra. Eles venderam o produto da colheita e tiveram um ano de prosperidade.

Concluída a colheita, os filhos do lavrador pensaram novamente na remota possibilidade de que o ouro talvez lhes tivesse passado despercebido. E foram cavar de novo em suas terras, mas sem resultado.

Transcorridos alguns anos eles acostumaram-se a semear e colher, seguindo o curso das estações, algo que não tinham aprendido antes.
Foi então que compreenderam a razão pela qual seu pai usara aquele expediente para discipliná-los, e se converteram em lavradores honestos e contentes com sua condição. Finalmente se deram conta de que possuíam riqueza suficiente para não precisarem se interessar pelo tesouro escondido.

Dá-se o mesmo com o ensinamento acerca da maneira de entender o destino humano e o significado da vida. O professor, ao defrontar-se com a impaciência, a confusão e ansiedade dos estudantes, deve encaminhá-los para uma atividade que ele sabe ser instrutiva e benéfica para eles, mas cuja verdadeira função e objetivo com frequência lhes permanecem ocultos devido a sua própria inexperiência.



A Parábola dos Filhos Cobiçosos

Esta história que enfatiza a afirmação de que uma pessoa pode desenvolver certas faculdades a despeito de seu esforço para desenvolver outras é, de maneira inusitada, muito conhecida. Isto talvez seja devido a ser prefaciada assim:
"Aqueles que a repetem obterão mais do que sabem".

Ela foi publicada pelo frade Roger Bacon (que citava a filosofia sufi e a ensinou em Oxford, de onde foi afastado por ordem do Papa), e pelo químico Boerhaave, que viveu no século XVII.

A presente versão é atribuída ao sufi Hasan de Basra, que viveu há quase doze séculos.



Extraído de
'Histórias dos Dervixes'
Idries Shah
Nova Fronteira 1976

29 julho 2008

Porque Estou Aqui?

Uma Noite Mullá Nasrudin caminhava por uma rua. A rua estava deserta e de repente se deu conta de que uns homens a cavalo, uma espécie de tropa se dirigia até ele. Sua mente começou a trabalhar. Pensou que podiam ser assaltantes, que podiam matá-lo. Ou que podiam ser soldados do rei e podíam levá-lo para prestar serviço militar ou qualquer outra coisa. Se assustou e quando os cavalos e o ruído que formavam se aproximaram, se pôs a correr e entrou em um cemitério e para esconder-se jogou-se em uma tumba aberta.

Ao ver aquele homem correndo, os cavaleiros que eram simples viajantes, se deram conta do que havia acontecido. Correram atrás do Mullá Nasrudin até a tumba onde estava. Ele jazia com os olhos fechados como se estivesse morto. O que lhe aconteceu? Porquê você se assustou tão de repente? Qual o problema?

Então Mullá Nasrudin se deu conta de que havia assustado a si mesmo sem motivo. Abriu seus olhos e disse: "É algo muito complexo, muito complicado. Se insistis em perguntar-me porque estou aqui, eu lhes direi. Estou aqui por vossa culpa e vocês estão aqui por minha culpa".
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É um circulo vicioso. Se tens desejos, tu irás ao futuro e isto criará um circulo vicioso. Quando este futuro se converter em presente, de novo você irá ao futuro. Hoje pensarei em amanhã; isto se converterá em um hábito. Amanhã nunca chegará. Não pode chegar é impossível. Quando chega é de novo o hoje e foi criado o hábito de ir sempre do hoje ao amanhã. Por isso quando o amanhã chega, chega como hoje e logo me vou de novo ao amanhã. É uma cadeia! E quanto mais a alimentares, mais eficiente te empenharás em completa-la. E o amanhã nunca chega. O que chega sempre é hoje, e com o hoje não tens nenhuma relação. Estabeleces um mecanismo: devido ao que é hoje, partes.

"extraído de Cuentos de Nasrudin - Idries Shah"

12 setembro 2007

Poesia de Rumi

Dia 30 de setembro será o 800º aniversário do nascimento de Rumi. Que nasceu em 1207 em Balkh, atual Afeganistão. Abaixo uma pequena amostra de suas poesias (enviado por Arnaldo):

Vem,
Te direi em segredo
Aonde leva esta dança.
Vê como as partículas do ar
E os grãos de areia do deserto
Giram desnorteados.
Cada átomo
Feliz ou miserável,
Gira apaixonado
Em torno do sol.
Ninguém fala para si mesmo em voz alta.
Já que todos somos um,
falemos desse outro modo.
Os pés e as mãos conhecem o desejo da alma
Fechemos pois a boca e conversemos através da alma
Só a alma conhece o destino de tudo, passo a passo.
Vem, se te interessas, posso mostrar-te.
Desde que chegaste ao mundo do ser,
uma escada foi posta diante de ti, para que escapasses.
Primeiro, foste mineral;
depois, te tornaste planta,
e mais tarde, animal.
Como pode isto ser segredo para ti?
Finalmente, foste feito homem,
com conhecimento, razão e fé.
Contempla teu corpo - um punhado de pó -
vê quão perfeito se tornou!
Quando tiveres cumprido tua jornada,
decerto hás de regressar como anjo;
depois disso, terás terminado de vez com a terra,
e tua estação há de ser o céu.
Não durmas,
senta com teus pares
A escuridão oculta a água da vida.
Não te apresses, vasculha o escuro.
Os viajantes noturnos estão plenos de luz;
não te afastes pois da companhia de teus pares.
Faltam-te pés para viajar?
Viaja dentro de ti mesmo,
e reflete, como a mina de rubis,
os raios de sol para fora de ti.
A viagem conduzirá a teu ser,
transmutará teu pó em ouro puro.
Sofreste em excesso
por tua ignorância,
carregaste teus trapos
para um lado e para outro,
agora fica aqui.
Na verdade, somos uma só alma, tu e eu.
Nos mostramos e nos escondemos tu em mim, eu em ti.
Eis aqui o sentido profundo de minha relação contigo,
Porque não existe, entre tu e eu, nem eu, nem tu.
Oh, dia, levanta! Os átomos dançam,
As almas, loucas de êxtase dançam.
A abóbada celeste, por causa deste Ser, dança,
Ao ouvido te direi aonde a leva sua dança.

Ontem à noite, confidencialmente, eu disse a um velho sábio:
- Não me esconda nada dos segredos do mundo!
Muito docemente, ele me disse ao ouvido:
- Podemos compreender, mas não exprimir!
Quero fugir a cem léguas da razão,
Quero da presença do bem e do mal me liberar.
Detrás do véu existe tanta beleza: lá está meu ser.
Quero me enamorar de mim mesmo, ó vós que não sabeis!
Eu soube enfim que o amor está ligado a mim.
E eu agarro esta cabeleira de mil tranças.
Embora ontem à noite eu estivesse bêbado da taça,
Hoje, eu sou tal, que a taça se embebeda de mim.
Ele chegou... Chegou aquele que nunca partiu;
Esta água nunca faltou a este riacho
Ele é a substância do almíscar e nós o seu perfume,
Alguma vez se viu o almíscar separado de seu cheiro?
Se busco meu coração, o encontro em teu quintal,
Se busco minha alma, não a vejo a não ser nos cachos de teu cabelo.
Se bebo água, quando estou sedento
Vejo na água o reflexo do teu rosto.
Sou medido, ao medir teu amor.
Sou levado, ao levar teu amor.
Não posso comer de dia nem dormir de noite.
Para ser teu amigo
Tornei-me meu próprio inimigo.
Teu amor me tirou de mim.
De ti, preciso de ti
Noite e dia, eu queimo por ti.
De ti, preciso de ti.
Não posso dormir quando estou contigo
por causa de teu amor.
Não posso dormir quando estou sem ti
por causa de meu pranto e gemidos.
Passo as duas noites acordado
mas, que diferença entre uma e outra!
Não temos nada além do amor.
Não temos antes, princípio nem fim.
A alma grita e geme dentro de nós:
- Louco, é assim o amor.
Colhe-me, colhe-me, colhe-me!

À noite, pedi a um velho sábio
que me contasse todos os segredos do universo.
Ele murmurou lentamente em meu ouvido:
- Isto não se pode dizer, isto se aprende.
A fé da religião do Amor é diferente.
A embriaguez do vinho do Amor é diferente.
Tudo que aprendes na escola é diferente.
Tudo que aprendes do Amor é diferente.
- Vem ao jardim na primavera, disseste.
- Aqui estão todas as belezas, o vinho e a luz.
Que posso fazer com tudo isso sem ti?
E, se estás aqui, para que preciso disso?

01 setembro 2007

Dois Contos de Nasrudin

AS ARMAS DO MULLÁ

Mullá Nasrudin iniciou uma viagem até terras distantes, motivo pelo qual conseguiu uma espada e uma lança. No caminho, um bandido cuja única arma era um bastão, se lançou sobre ele e roubou seus pertences.

Quando chegou a cidade mais próxima, O Mullá contou sua desgraça a seus amigos, que lhe
perguntaram como ele, armado com uma espada e uma lança, não havia podido dominar a um ladrão armado com um modesto bastão.

Ele replicou: O problema foi precisamente que eu tinha as duas mãos ocupadas, uma com uma espada e a outra com uma lança. Como crêem vocês que poderia eu sair vitorioso?

A interpretação desta história se mostra evidente ao conhecer outra acerca do erudito.

O ERUDITO

Mullá Nasrudin conseguiu trabalho como barqueiro. Certo dia, transportando a um erudito, o homem lhe pregunta:

- Você conhece a gramática?

- Não, em absoluto – responde Nasrudin.

- Bem permita dizer-lhe que você perdeu a metade de sua vida – replica com desden o erudito.

Pouco depois, o vento começa a soprar e a barca está a ponto de ser tragada pelas ondas. Justo antes de ir a pique, O Mullá pregunta a seu passageiro: - Você sabe nadar?

- Não! - responde aterrorizado, o erudito.

-Bem, permita-me dizer que você perdeu toda a sua vida!

Esta segunda história se relaciona diretamente com a anterior.

Nos diz: De que serve ter um conhecimento se não sabemos aplicá-lo a realidade? Em outras palavras de que serve nos amarmos de um saber inútil? Depois de haver lido ambas as histórias me pergunto: Que é? De que falo? É necessário instruir-se? Se é importante fazê-lo, porém temos de indagar de que serve o conhecimento adquirido e saber desfazermos do que é inútil. Por minha parte prefiro utilizar o conhecimento para desenvolver uma técnica pessoal que conheça a fundo e se aplique a realidade, em vez de colecionar milhões de conhecimento que nunca são aplicados.
De que servem todas as teorias sobre a sexualidade, o amor, o bem, a oração, ...., se jamais a aplicou?

É como esconder-se atrás deste saber, para não fazer nada.

Extraído do Livro: "Cuentos de Nasrudin" de Idries Shah